3 de fevereiro de 2007

LEVANTA A CABEÇA

A tua vida não é um emplastro. Nessa rotina que não sentes e não vês, nessa rotina que te esmaga e que te tortura, nessa rotina que não desejas e não queres para ti vais amando e entregando-te a dezenas de pessoas a quem fazes muita falta. Vais-te gastando, discreta como um fósforo que por uns segundos ilumina uma sala escura. E, cega de desespero, não te deixas apaixonar pelos sorrisos que te vão sendo devolvidos; não te apercebes que a tua chama contagia.

A tua vida só será emplastro na medida em que te demitires dos teus sonhos e deixares que eles te passem ao lado. Podes fazer coisas muito pequenas e sem valor aos olhos de quem te rodeia. Pode até acontecer que não te apercebas do seu valor. Mas, se forem verdadeiras e num movimento sincero de entrega, são perolas que brotam do mais profundo de ti. São tesouros que pela sua generosidade e inocência deixam de poder ter valor. Pergunto-te quanto vale o beijo apressado de um pai que deixa os filhos na escola? Perderá o seu valor por ser apressado?

Não te iludas com o teu sentir... É quando duvido mais de mim próprio e da utidade daquilo que faço que estou mais seguro da bondade daquilo a que me proponho. Porque as coisas boas da vida, os nossos sonhos são mesmo assim, difíceis de obter e fáceis de duvidar.

Deixa-te tocar sinceramente por esse sentir que te consome. Assume o risco de gostares de ti pequena como és. Assume o risco de acreditar por um segundo que as pessoas não valem pelo que tem ou pelo que fazem mas sim por tudo aquilo que são, principalmente pela fragilidade que encerram e nos interpela a agir e pela força que emanam e nos conforta nas nossas quedas.

Levanta a cabeça e assume o risco de rasgar no teu coração esses critérios mesquinhos de grandeza e auto-suficiência que te torturam a alma. Abraça com toda a força essa miséria que aos poucos descobres em ti própria... É o preço que a tua vida te cobra por perseguires os teus sonhos.

E, depois de chorares, do buraco com que vais ficar no fundo da tua alma não deixes que se forme aquela cicatriz disforme própria de quem a vida derrotou. Faz desse teu novo espaço de alma inquietação permanente e movimento inconformado que perpetuamente te projecte sobre os outros. Porque a isto... A isto chama-se sonhar!