30 de maio de 2007

DE MÃOS BEM ATADAS

Gostava de viver de mãos bem atadas!

Gostava de ser como o Ulisses a passear-se pela ilha das sereias, contemplando a vida e dela tirando todo o proveito sem a ela se subjugar. De mãos bem atadas, conseguir ser sensivel às seduções do mundo, sabendo reconhecer e aproveitar a verdade que as suas belezas encerram sem nunca me consumir nas ilusões nas quais me querem precipitar.

Gostava de viver de mãos bem atadas! De mãos firmemente atadas aos mastros que no barco dos meus sonhos alicerçam a minha rota. Mastros com as suas velas abertas ao impossível e ao improvavel, àquilo que teimo em não acreditar e em não acolher. Velas que só assim me podem impelir onde eu não me saberia conduzir.

Gostava de viver de mãos bem atadas! De mãos firmemente atadas pela minha própria dor. Esta dor que logo se transforma em sede de verdade, justiça e perdão. Dor que, ainda que não o desejasse, me desinstala e me projecta sobre ti que teimas em não me acolher. Que me obriga a incomodar-te. Esta dor que no meu silencio, me faz denunciar no mais profundo da tua alma, com a minha vida, a hipocrisia das tuas palavras.
Gostava de viver de mãos bem atadas! De mãos firmemente atadas pelas necessidades daqueles que (de mãos atadas pela vida) clamam por alguma liberdade, paz e conforto. Necessidades que , ainda que não o desejasse, me desinstalam e me projectam sobre mim que teimo em não te acolher. Que me obrigam a incomodar-me. Estas necessidades que no seu silêncio denunciam no mais profundo da minha alma as minhas próprias fragilidades.

Gostava de viver de mãos bem atadas! De mãos firmemente atadas ao leme da minha vida! Indiferente ao clima, fiel à rota que dia a dia se vai trilhando. Cheio de Fé! Dócil mas firme diante da agitação tempestuosa das dificuldades! Humilde mas confiante nas calmarias bonançosas da vitória!

Nem sempre sou assim... Raramente consigo ser assim!
Gostava muito de saber viver cada vez mais de olhos bem fechados...
Gostava muito de saber viver cada vez mais de boca bem fechada...
Gostava muito de saber viver cada vez mais de mãos bem atadas!

29 de maio de 2007

DE BOCA BEM FECHADA

Quanto vale um silêncio? Já te apercebeste do tanto que, cruzando olhares profundos, nele se troca sem nada se dizer? E por vezes o tanto que se perde na verborreia precipitada de quem não (se) sabe escutar.

Gostava de saber falar-te sempre de boca bem fechada. Naquele silêncio agradavel, próprio de quem te escuta e se interessa por ti. O mesmo e único silêncio no qual, pela sua cumplicidade comprometida e desapegada, podes encontrar respostas concretas e objectivas aos teus anseios.

Gostava de não ter de justificar os meus actos por palavras. Pelo contrário, de boca bem fechada, ter o dom de justificar com a minha vida aquilo que, desbocado, vou dizendo por ai. Não ter de ser advogado em causa própria, vivendo antes numa constância serena, ingénua diante da vida que se me dá, destemida diante das dificuldades e indiferente aos riscos de ousar ser vertical.

Gostava que a minha alma me soubesse sempre falar de boca bem fechada, com um olhar perspicaz e tolerante, desafiador e acolhedor. Não se vangloriar nos seus submundos pelos seus méritos nem tão pouco desprezar-se nos seus fracassos. Assim livre e verdadeira diante de si própria, não perseguindo o erro para o evitar nem a verdade para a alcançar sem olhar a meios.

Consegues escutar o meu (teu) silêncio? De boca bem fechada... que te diz ele?

24 de maio de 2007

DE OLHOS BEM FECHADOS

Nestes dias tenho tido a sorte de caminhar de olhos bem fechados. Atento aos sonhos e indiferente aos precalsos que se colocam no meu caminho. A vida encarregou-se de me tomar nos seus braços e relançar-me no meu percurso.

A minha volta, enquanto dormia, o tempo fazia as suas maravilhas, curando corações e fechando feridas que sendo médico, mesmo que o desejasse (e como o desejei) jamais saberia tratar.

Gostava de saber agir activamente neste sentido. Gostava de saber sacudir a pressão e, de olhos bem fechados, acolher sofregamente os desafios que a vida me coloca. Deixar-me surpreender e maravilhar pela gratuicidade daquilo que quem nada espera em tudo sabe recohecer.

Este é um tempo propício a que também tu acredites. Não numa fézada feita daquelas rotinas místicas que te acorrentam e iludem, não naquele testemunho puritano e hipócrita que afasta e desilude quem tudo espera de ti

Vem comigo! Olha para o centro de ti, reconhece em humildade a centelha de benignidade que a Vida te inspira na tua família, nos teus amigos, no teu trabalho e no teu estudo. E então, sem medos, caminha de olhos fechados! Se o fizeres terás a sorte de veres milagres que os teus olhos nunca conseguirão compreender.

12 de maio de 2007

ABISMOS

Não é a primeira vez que reflicto nisto, mas nunca me deixo de maravilhar com esta realidade. É quando se está diante da dor e da maldade que se torna mais evidente a necessidade de as rejeitar.

Porque é quando passamos o dia a picar doentes sem conseguir picar uma única artéria que desejamos que não fosse assim, nem que seja só pela irrazoabilidade total da dor do doente diante de mais uma tentativa frustrada de lhe colher sangue. Porque só quando sabemos que dos seis doentes que estão na enfermaria, cinco não passarão do mês que vem é que nos apercebemos da urgência deste Amor que lhes coloca na boca um "doutor deixe-me ir para casa, quero almoçar à mesa um pouco de leitão com a minha mulher, os meus filhos e amigos!".

Que desconfortável, que revoltante! É esta dor o espinho que se crava no meu coração e uma vez mais me projecta para diante. É esta dor, tão presente também na tua humanidade concreta, que se quiseres se pode cravar no mais profundo do teu coração e projectar-te de novo para diante.

Loucura? Talvez! Mas não quero ter outra forma de estar na vida. Qualquer outra opção será sempre pior, pela cegueira e hipocrisia que implica. Pelo demitir-me da tua vida e dos teus problemas, que tantas vezes- num simples apoio de um sorriso abandonado que me é pedido- são a chave dos meus problemas.

Utopia? Sonho? Ideal? Sim tem esta faceta... Quantas vezes o conforto me seduz e me instala questionando-te e questionando-me se será mesmo verdade aquilo que te digo... Contudo, a duvida não silencia as lágrimas de quem me rodeia, de quem te rodeia. Apenas adia para amanhã a realidade de um sonho anestesiado que teimamos em não construir já hoje.

Ainda que chore, ainda que custe, ainda que me pareça irrazoável, prefiro este coração sangrante e magoado. Não consentirei que no seu lugar se perpetue esta pedra dura que, por minha vontade ou indiferença, todos os dias se vai renovando e me vai lançando nestes abismos.

Do profundo abismo clamo a Ti, Senhor...
Senhor, ouvi a minha prece!

5 de maio de 2007

RECUSA

Doeu muito quando aquela velhinha recusou o internamento. Magoa a alma sentirmos que ainda há qualquer coisa de benévolo a fazer por alguem e esbarrarmos diante da sua frustração e sentimento de derrota.

Não somos deuses, o nosso poder de condicionar é limitado e regra geral só é eficaz quando movido por más intenções. Como é difícil desestruturar a derrota e a morte de uma alma. Como é difícil enche-la de Esperança e Verdade.

Mas este é um bom combate! Por muito que doa, ainda que seja um caminho de lágrimas e humilhação, derrota a derrota, aprenderei a vencê-lo!

EGOISMO

Nestes dias tenho estranhado muito alguns amigos e outros desconhecidos que me tem passado por perto. Escandaliza-me que numa sociedade cada vez mais egoista, as pessoas teimem em negar e em não proteger aquilo que de riqueza têem no seu egoismo.

Corre-se para a ultima peça da moda, para o carro topo de gama ou para o telemóvel que faz de tudo menos chamadas em condições. Mas quando toca ao intrinseco da nossa liberdade e autonomia, quando se trata dos nossos valores e afectos, depressa nos complexamos dizendo que somos egoistas por os querermos proteger e resguardar.

As almas sempre foram egoistas e independentes. Está-nos no tutano do osso. Para o bem e para o mal existirá sempre este mecanismo de auto-protecção que não nos podem tirar ou apagar. Faz parte da nossa humanidade. Magoa-me toda esta hipocrisia com que se olha para esta realidade.

A cada um de vocês, que sei que hão de ler este post, digo-vos: Lutem pela vossa chama e individualidade!! Não deixes de escrever aquilo que pensas porque alguem discorda de ti, não te limites a ser meia pessoa porque alguem quer que não sejas aquilo que és, não te sintas perseguida nessa tua liberdade que nunca te poderei tirar.

Esquecemo-nos que o nosso egoismo nos abre naturalmente sobre o outro, que também é dele que brota esta capacidade fantástica de nos consumirmos e darmo-nos por algo ou alguem. Esquecemo-nos que ninguem nos obriga a fazermos entrega da nossa vida, dos nossos talentos e qualidades e que só o fazemos porque queremos.

Esquecemo-nos que ao faze-lo (ainda que de forma egoista) valorizamos quem nos acolhe. Porque sejamos honestos... Há imenso sítio e milhares de pessoas onde nos podemos consumir até ao último folego. Se o fazemos aqui ou acolá, terá sempre de ser porque vale a pena.

E sobretudo não olhamos para o nosso egoismo com olhos sonhadores. Depressa nos vendemos a trinta talentos de nadas em consolos racionais ou afectivos para nos esquecemos de ser egoistas no assumir deste nosso mérito pessoal. Temos complexos em valorizar aquilo que realmente temos de bom e genuino.

Tem-me feito falta cumplices de caminhar, que quando colocados diante da solidão, sabem responder-me com o seu caminhar sofrido com um "porque sim! porque a vida é assim!" humilde e despojado de vontades mas muito egoista de responsabilidades.