29 de janeiro de 2007

SEDE

Tenho sede... Tenho sede de pessoas cujas palavras sejam consequencia dos seus actos... Sonhadores realistas e inconformados que constroem passo a passo, sem receio de verter lágrimas, os seus sonhos. Herois fantásticos de um mundo bem real.

Tenho sede de sorrir diante das dificuldades e precipitar-me na vida com as asas do sonho, absorto no teu sorriso cumplice e desafiador. E tu... Tu que te cruzas comigo num qualquer recanto das nossas almas... Tu dás-me de beber desse teu vinagre de medo, de receio instalado e calculismo reservado que não ousas enfrentar.

Se é o que tens para dar, aceito-o. Bebe-lo-ei mesmo com sofreguidão, até à ultima gota. Porque um dia bebeste e quem sabe quando beberás outra vez deste mesmo vinagre que também me corre nas veias. Mas custa-me, custa-me muito esta acidez que me queima a língua e revira os olhos.

Tenho sede desse teu brilhar de olhos ingénuo, comprometido contigo, comigo e com o mundo. Tenho sede de nesse teu compromisso inocente com os teus sonhos te sentir livre! Livre de ti própria, livre de mim e dos meus condicionamentos, livre de tantos constrangimentos.

Por onde anda essa tua alma indomável que sei não poder conter? Tenho sede dessas águas torrenciais de afectos que na sua força imparavel arrastam para longe a modorra e refrescam os campos do meu coração.

Tenho sede...

27 de janeiro de 2007

TEM-ME INCOMODADO

Tem-me incomodado muito a forma como tem evoluido a campanha à volta do referendo ao aborto. Cada vez mais sinto que os partidários do sim e do não se assemelham a claques de futebol inebriadas num extase de panfletos, slogans e muita falta de compromisso.
Creio que me atiram areia aos olhos com este referendo... Porque falta humildade para olhar para o problema, serenidade para o reflectir e coragem para o enfrentar.

Independentemente do resultado do referendo nada mudará para as mulheres que se virem confrontadas com a sombra de terem de abortar. Porque sejamos honestos, encaminha-las para um hospital onde haja condições condignas para abortar ou ser objector de consciência sem ter mais nada para lhes oferecer, será sempre abandoná-las à sua solidão num lavar de mãos hipócrita (independentemente da nossas opções morais).

Creio que o verdadeiro problema destas mulheres não será tanto a sua gravidez. Creio que somos todos nós que no nosso conformismo e não ingerência teimamos em demitir-nos de um problema que a todos nos envolve.

Infelizmente, de ambos os lados da barricada, entre muita eloquencia e o pavonear de argumentos brilhantes, contam-se pelos dedos de uma mão quem se tenha envolvido por soluções concretas que visem a melhorar a situação destas mulheres. Soluções simples mas que lançam desafios muito mais exigentes do que mobilizar-se uns meses, mandar os seus bitaites e deixar o seu voto numa urna com a falso conforto de ter cumprido com o seu dever de cidadania.

Inebriados por este debate "cientifico-afectivo-filosófico-ético-moral-político-religioso" (porque num referendo, e ao contrário das teses vingentes, creio que todos estes aspectos são relevantes à reflexão) muito pouco se tem dito e nada se tem feito pela melhoria real das condições de maternidade. Deixaram-se cair prioridades fundamentais como sejam a protecção estatal e por entidades privadas da maternidade, politicas que promovam a natalidade como sejam por exemplo a equiparação da maternidade a profissão (com direito a horário e remuneração como se faz no norte da Europa) ou a diminuição dos impostos dos casais em função do número de filhos, a promoção da paternidade responsavel, a promoção de um planeamento familiar consciente ou a prevenção das doenças sexualmente transmissiveis e melhoria da saúde reprodutiva da população.

E a isto, que eu saiba... A este faz barulho sem te envolveres.. Chama-se demagogia!!! Assim vai a minha democracia!

NA IDADE DOS PORQUÊS

Sinto-me muito na idade dos porquês, aquela em que a inocência e a ingenuidade choca com a realidade...

Pergunto-me...

1- Porque é que passo 10 minutos a frente do doente e cinquenta à frente do seu processo?
2- Porque tenho de estar 20 minutos ao telefone e passar por quatro pessoas do laboratório para saber que afinal bastava por uma nota na folha de requisição para fazerem a tal analise.
3- Porque é que todas as requisições tem que se fazer pelo menos em triplicado?

Detesto burocracia...

20 de janeiro de 2007

VELAS AO VENTO

A vida corre-me diante dos olhos a uma velocidade alucinante, são momentos, sao milhões de sentimentos... É tão dificil acentar e reter algumas ideias.

Sabe bem abrir as velas ao vento e deixar-me levar por tudo aquilo que me é pedido. Cresce-se muito depressa. Mergulhado nas necessidades dos que me rodeiam perco a noção dos meus problemas, melhor ainda... Apercebo-me que podem ser bem pequenos! É claro que se paga um preço. O duro preço de simplificar processos e deixar para trás coisas que me são tão importantes. Acredito e tudo farei para as reencontrar já na próxima curva da vida.

A tempestade de afectos é enorme e tão contraditória que nem me atrevo a tentar descreve-la... Não o saberia fazer, ainda não tenho recuo para tal. Para já contemplo-a como quem, fazendo um puzzle, começa por estudar meticulosamente cada uma das peças que o compõem e deixo-me apaixonar pelas suas cores que do cinzeto escuro ao branco respladescente percorrem todo o espectro luminoso.

FAZER DAS PALAVRAS VIDA

Nunca se sabe até onde as palavras nos podem levar, mas espero sinceramente que estas, nunca as leve o vento!

No momento de ser admitido como membro da profissão médica:
Prometo solenemente consagrar a minha vida ao serviço da humanidade.
Darei aos meus mestres o respeito e o reconhecimento que lhes são devidos.
Exercerei a minha arte com consciência e dignidade.
A saúde do meu doente será a minha primeira preocupação.
Mesmo após a morte do doente respeitarei os segredos que me tiver confiado.
Manterei por todos os meios ao meu alcance, a honra e as nobres tradições da profissão médica.
Os meus colegas serão meus irmãos
Não permitirei que considerações de religião, nacionalidade, raça, partido político, ou posição social se entreponham entre o meu dever e o meu doente.
Guardarei respeito absoluto pela vida humana desde o seu início, mesmo sob ameaça e não farei uso dos meus conhecimentos médicos contra as leis da humanidade.
Faço estas promessas solenemente, livremente e sob a minha honra.

12 de janeiro de 2007

CASA DAS MÁQUINAS

Custa-me muito ter o coração em baixo... Já me pus a caminho, mas ele é sempre o último a querer arrancar. Largou âncora nas margens do desespero e esforça-se por contrariar os ventos auspiciosos da vontade e do sonho.

E como é difícil levantar esta âncora. Sinto-me comandante de um barco com a casa das máquinas no rescaldo de um grande incêndio. A tripulação é voluntariosa e esforçada, mas o motor, entorpecido, não consegue acelerar muito o ritmo… Quando a corrente é propícia avança-se, mas assim que se entra em águas conturbadas, traído pela fragilidade do motor, depressa se fica à deriva.

Custa-me muito esta fragilidade de coração que proclama solene o terrível fado de uma vida feita de “dias sim e dias não”, esta fragilidade que contrariando o meu desejo de regressar e colocando-me dependente da boa vontade dos ventos e das marés me dificulta o movimento de fazer de cada instante um novo sim.

A este capitão, restam porém vários consolos… A segurança de ter uma tripulação motivada e esforçada, a felicidade de descobrir que nas vossas palavras vão soprando bons ventos, o encontro de uma maré que me tem sido tão propícia na vossa preseça disponivel e a certeza que aos poucos, nas profundezas da casa das máquinas em breve as reparações estarão concluídas.

PEDRAS DE CALÇADA

Ao fazer caminho olha-se inevitavelmente para as pedras da calçada. Gosto muito desta tradição tão lisboeta. Sempre que vou de viagem estranho a frieza dos passeios graníticos ou asfaltados e sinto falta daquelas pedrinhas alinhadas.

Naquela ordem em que foram colocadas formam verdadeiras obras de arte que encantam. Distraídos pelo todo nem sempre prestamos atenção às partes… Gostava de conhecer as suas almas, conhecer cada uma destas pedras pessoalmente.

E que almas! Simples pedras… rudes e frias! Contudo, na sua imutabilidade predispõem-se a ser permanentemente pisadas e repisadas por passos apressados e indiferentes. Simples, dão-se voluntariamente à humilhação da indiferença em proveito daqueles que as humilham. Pergunto-me… Saberão elas a lição que me dão?

FAZ PELA VIDA
























Relembrando o que já disse continuo com as mesmas Dúvidas

Não te fiques pelas palavras...
Dia 28 de janeiro faz pela vida!!!




10 de janeiro de 2007

À PETITS PAS

Os primeiros passos do regresso são sempre tímidos, como o gatinhar da criança. Fazendo coisas pequenas como arrumar o quarto ou escrever uma carta a um amigo cumpro com pequenos objectivos e ganho motivação e inércia para o resto do caminho.

Neste gatinhar maravilho-me com pequenas coisas que há muito tempo tinha deixado ao pó no sótão da alma. Como é bom perceber que a qualidade daquilo que fazemos não depende da dimensão do projecto em que estamos implicados mas sobretudo da seriedade com que nos entregamos e nos deixamos preencher pelos pequenos desafios da vida. Dar-me com a mesma entrega aos lençóis que se querem bem esticados da cama como me dei um dia a um exame que sabia definiria uma boa parte da minha vida e sentir a mesma alegria elementar diante de ambos os resultados. Será uma migalha, só por ser pequena, menos pão?

Mas nem tudo é um mar de rosas. Custa muito olhar para as grandes coisas que já fiz outrora e, comparando-as com o pouco que consigo dar neste momento, ser capaz de as confinar a um passado que já não me pertence. Mas penso que é esta a abordagem! Deixar tudo para trás crente que é neste momento uma ilusão que embacia e turva a forma como olho e reajo ao meu presente.

Ainda tens a inocência da criança para te aperceberes disto? De perceberes que a força da tua vida transcende em muito as dificuldades que te rodeiam dando-te sempre a possibilidade de te entregares e assim receberes? E sendo mais ousado… Consegues encontrar nessas dificuldades, às quais te furtas, pretextos gratuitos para construíres felicidade?

É tempo de timidamente e “à petits pas” deixarmo-nos todos de palavras vãs e saudosismos bacocos de um passado porventura glorioso que já não nos pertence, e nos gestos pequenos do nosso dia a dia assumirmos sorridentes os desafios que a vida nos propõe.

8 de janeiro de 2007

POLO NORTE

1-BÚSSOLA

Como se comportará a bússola no pólo norte? Que sensação trará ao caminhante ver a sua agulha rodar freneticamente. Sobretudo quando à sua volta se estende um deserto branco a perder de vista. Será que na amargura da incerteza se apercebe que a sua expedição terminou e que chegou ao seu destino?

Pode custar muito chegar ao fim da expedição e deparar-se com um objectivo cumprido. No caminho não sabemos o que nos espera… E chegando ao fim, diante da bússola oscilante que relativiza o destino da expedição, descobrimos a essência do propósito a que nos lançamos um dia. Descobrimos esta Humanidade que na sua pobreza de sonhos infinitos construídos com recursos limitados encontra a sua verdadeira riqueza.


2- POLO NORTE

Nas inevitáveis contas do deve e haver da alma nas quais o silêncio desnorteado da bússola nos mergulha, ganhamos recuo sobre o trajecto cumprido. Apercebemo-nos dos momentos em que reinou o desejo genuíno de ir mais além e daqueles em que deixamos que estes mesmos propósitos se consumissem na mesquinhez avara de um suposto sucesso que nada tem que ver com a realidade alcançada.

Nesta singularidade que é o pólo norte, se em relação ao passado as conclusões surgem muito óbvias, no presente que –por ser de um caminhante sonhador -se quer projectar sobre o futuro, só temos uma cúmplice. Chama-se ambiguidade. A indecisão submerge o caminhante. Que caminho tomar de regresso? Para que lado está a nossa casa?

Experimenta-se toda a ambivalência da nossa liberdade. A incerteza profunda de não se saber por onde se deve regressar estranhamente amalgamada à felicidade insuperável de se saber que qualquer rota nos tirará deste impasse.

3- REGRESSANDO

E depois de uns momentos de medo e insegurança percebe-se! Na oscilação da bússola descobrem-se as novas fronteiras que agora limitam o desconhecido da nossa alma. E deseja-se partir ao seu encontro.

A primeira vista parece sempre mais fácil o regresso. Contudo é a parte mais difícil da viagem. Deixa de se ter diante dos olhos a novidade aliciante do desconhecido para se ser confrontado com o reencontro com caminhos conhecidos que sem nos seduzirem tem que ser redescobertos e percorridos.

É a viagem da fidelidade a todo o sonho… Aquela onde revisitando todas as rotinas do caminho que julgamos conquistado se experimenta na carne que não se pode ser fiel nas grandes glórias sem o ser também nas pequenas obrigações.

E por ter percebido isto hoje, creio ter dado o primeiro passo… Sei que por ter estado parado, os próximos passos serão muito pequeninos. Mas quero muito dá-los!

6 de janeiro de 2007

PRISÃO DE PAPEL

Detesto a auto-comiseração! Detesto este sentimento que lentamente enche os espaços que no meu intimo não consinto que a minha vida preencha. Este sentir que pretende justificar-me perante mim próprio e vender-me a ideia que na dificuldade o melhor que tenho a fazer é imitar as avestruzes e por a cabeça na areia à espera que a caravana passe.

Detesto este sentir que volta e meia me segreda ao ouvido uma pequenez que nada tem a ver com humildade ou virtude. Uma pequenez que por mesquinha não quero que seja minha! É a pequenez do cobarde que se atemoriza diante das dificuldades. Aquela que mata os sonhos pela raiz e que nos verga a uma vidinha insonsa e sem sal.

Não me conformo com o meu sentir. Posso não saber reagir com mais impeto, mas conformar-me com isto não me conformarei! Porque sei que a nuvem é sempre passageira, que por trás dela estará sempre o sol que brilha e o seu calor que me aquece.

Porque a maior prisão que um homem pode ter é esta prisão de papel que se impõe a si próprio. Este círculo vicioso de infinitamente se desapaixonar da vida e dela se desinvestir iludido na crença de que a vida para ser feliz terá de ser sempre doce e agradável, um produto pré-confecionado pronto a consumir.

5 de janeiro de 2007

AUTOCARROS

As vezes naqueles dias de chuva, cruzo-me com um autocarro cheio de gente a caminho do trabalho e dou por mim a perguntar-me sobre o que lhes irá nas almas. Seguramente a mulher, o marido, os filhos, a namorada, o que ficou por fazer no trabalho ou as contas do fim do mês.

Naqueles autocarros apinhados descubro o quanto todos nós somos iguais no nosso íntimo. Como, sendo cada um de nós tão profundamente individual e não sobreponivel, acaba por ser uma redundância desta condição humana que nas suas aspirações e limites partilha os mesmos sonhos e medos.

Acabo invariavelmente por me projectar sobre tudo isto. Os autocarros fazem-me mal ao orgulho e bem ao ego.

Faz-me mesmo muito mal ao orgulho. Custa muito perceber que neste concreto único que vivo sou redundante. Considerar e assumir como verdadeira a hipótese de que os meus dramas pessoais são neste momento experimentados por uma outra pessoa que não conheço. E mais mal me faz ao orgulho aperceber-me que ambos somos redundâncias de tantos outros que antes de nós passaram pelo mesmo e de outros tantos que num futuro mais ou menos remoto também por isto passarão um dia. E assim, numa passagem, estes autocarros pulverizam num ápice toda esta impressão de autoconfiança e auto-suficiência com que o meu orgulho -próprio de quem sabe ter uma experiência pessoal e maravilha-se com a sua individualidade -me ilude.

Mas é um preço que julgo justo. Porque me faz um bem enorme ao ego. Percebo que nesta condição humana nunca estou sozinho e que é esta partilha involuntária que nos precipita irremediavelmente uns sobre os outros. Percebo que é por partilharmos tudo isto que no nosso íntimo nos conseguimos perceber e entender com uma profundidade brutal. Uma profundidade tão grande que por vezes basta a simplicidade de um silêncio cúmplice que mil palavras não sabem descrever. Que é nesta partilha involuntária que posso encontrar amparo e dar apoio àqueles me rodeiam. E isto, diante do meu orgulho, não tem valor.

Autocarros…

3 de janeiro de 2007

SIDERURGIA

Uma das coisas que mais me intriga é a nossa relação com a dor. É curioso ver a diversidade de respostas que induz nas pessoas. Os estudos ensinaram-me que a dor é um mecanismo de defesa fundamental. Se durante uma queimadura não nos doesse seguramente não afastaríamos a mão da chama e deixaríamos que se produzisse uma queimadura grave.

Não deixa no entanto de ser uma sensação muito desagradável. Nestes tempos tenho sido contrariado em quase todas as minhas expectativas e desejos. E dói… Sem ser masoquista e esperando sinceramente que tudo isto acabe depressa, ainda bem que é assim!

As vezes, quando estou mergulhado na felicidade, é-me muito difícil aperceber-me do real valor, da beleza e da sorte que tenho na minha vida. Já quando mergulho na escuridão do abismo a cegueira forçada desperta-me a consciência. Os contrastes fazem com que o choque seja brutal. Apercebo-me depressa que aquele não é o meu meio. Sentindo a dor que me aperta, revisito e experimento -numa fracção ínfima -as vidas dos mais desprotegidos e surge uma profunda repulsa diante do mal que me inquieta e desinstala. Encarna-se na minha vida o aforismo popular que postula “não faças aos outros aquilo que não queres que te façam a ti” e nasce uma adesão sincera à benignidade.

Gosto muito dos momentos em que a vida me molda gentilmente como o oleiro molda o seu barro. Contudo percebo e aceito que por vezes -para crescer -o meu coração tenha de mergulhar nas caldeiras de uma siderurgia infernal. Percebo e aceito que para tomar forma tenha de ser levado ao seu ponto de fusão e rotura e martelado com batidas repetidas, violentas e muito dolorosas.

Por agora não percebo onde sou levado… Mas tenho a perfeita noção que estou a ser moldado e, nem que seja só por isso, no meio da turbulência, não posso deixar de sorrir!